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MISHub QI

Mulheres na Engenharia Civil: Desafios Académicos e Profissionais para Estudantes e Recém-Formadas em Moçambique

Mulheres na Engenharia Civil: Desafios Académicos e Profissionais para Estudantes e Recém-Formadas em Moçambique

O objectivo desta entrevista é compreender os desafios enfrentados durante a formação e o início da carreira, a interação no ambiente profissional, as preferências entre o trabalho de campo e de escritório, e as estratégias que elas utilizam para superar barreiras. Esta entrevista visa destacar a crescente participação feminina no sector e inspirar futuras gerações.

 

Na sua experiência durante o estágio ou trabalhos práticos, como foi recebida pelas suas equipes? Sentiu que houve desafios adicionais por ser mulher?

Yara Raviua: "Bom, durante a minha experiência nos trabalhos práticos, fui bem recebida graças a Deus! Enfrentei desafios adicionais por ser mulher naturalmente, visto que o curso de engenharia civil é uma profissão em que o público feminino ainda é menor nos cargos do sector, as equipes de trabalho subestimaram as minhas habilidades, principalmente em subir andaimes e escalar alturas."

Eng.ª Cleide Santos:

"Minha experiência no estágio e durante os trabalhos práticos foi muito positiva. Graças a Deus, as equipes com as quais trabalhei sempre foram receptivas, e não enfrentei grandes dificuldades para me adaptar a um ambiente predominantemente masculino.

Contudo, por ser uma das poucas mulheres, isso inevitavelmente gerava uma certa pressão e chamava a atenção dos colegas. Em uma sociedade ainda marcada por atitudes machistas, algumas vezes ouvi comentários sobre como as mulheres seriam "preguiçosas" ou "não gostam de trabalhar", especialmente após o casamento.

O curioso é não estava na dúvida minha capacidade técnica, afinal, minha presença ali já era uma prova de que acreditavam em minha competência. A dúvida parecia estar voltada para o futuro, por quanto tempo eu resistiria antes de me adequar ao papel tradicional de dona de casa sustentada pelo marido.

Embora não seja o meu caso (não sendo casada), essa situação gerava insegurança, e eu me sentia pressionada a dar o meu melhor para evitar julgamentos e não comprometer o profissionalismo."

Nicolle Mapulango: "Não, graças a Deus eu estava a estagiar numa empresa onde 60% dos funcionários é do sexo feminino, então não houve nenhum desafio."

 

Quando pensa no seu futuro na engenharia civil, prefere trabalhar mais tempo em um escritório elaborando projetos ou prefere a interação direta com o terreno, acompanhando a execução das obras? Por quê?

Yara Raviua: "Inicialmente trabalhei no escritório e pude perceber que o ambiente no escritório tende a ser mais controlado, sem os imprevistos e desafios que surgem diretamente no estaleiro de obras tornando a rotina mais previsível. Para ser honesta e verdadeira, prefiro a interação direta com o terreno, pois, têm sido uma experiência enriquecedora para mim. Acompanhar a execução de obras no terreno torna a visão mais ampla e ter acesso na obra aos resultados do meu trabalho na prática, é também uma experiência extremamente gratificante." 

Eng.ª Cleide Santos: 

"Actualmente, estou trabalhando na elaboração de projectos, mas gostaria de ter mais interação com o terreno e fazer parte de uma equipe de gestão de obras. Acho muito interessante a experiência prática no local, e, se tivesse oportunidade, trabalharia por alguns anos no campo para adquirir experiência.

No entanto, minha preferência é pela elaboração de projectos. Gosto muito da parte criativa, sentar, analisar e desenvolver soluções para problemas é algo que me motiva bastante. Além disso, trabalhar com projectos permite lidar com uma maior variedade de desafios, pois, em um ano, é possível desenvolver vários projectos diferentes. Já no campo, dependendo do tamanho da obra, pode-se passar anos trabalhando em um único projecto."

Nicolle Mapulango: "Gosto de pensar em 40-60, mais na obra do que no escritório, estar na obra é muito cansativo sim, mas é onde acontece toda a acção e os meus docentes sempre recomendaram que no início da carreira passássemos boa parte do tempo na obra para ver como funcionam as coisas e só depois ficássemos no escritório, então pretendo seguir esse conselho."

 

Como você vê o impacto das condições de trabalho nas obras, especialmente em um ambiente predominantemente masculino? Como isso afetou a sua experiência?

Yara Raviua: "Em estaleiro de obras não é um lugar '5 estrelas' comparado ao escritório. Lembro me que no primeiro dia, quando perguntei onde ficava o WC, à priori achava que existisse um masculino e outro feminino. Porém, percebi que as condições em estaleiro de obras não são planejadas para atender adequadamente às necessidades das mulheres e isso causou-me um certo desconforto, constrangimento e insegurança ao compartilhar o WC com os homens. Senti-me excluída, o que impactou diretamente na minha experiência naquele ambiente de trabalho."

Eng.ª Cleide Santos: 

"Durante o meu percurso, estive diretamente envolvida apenas em uma obra residencial, onde eu era a única mulher, a mais jovem e a única com nível superior. As condições de trabalho não eram as melhores, pois, em Moçambique, raramente se investe em banheiros adequados (femininos ou masculinos) ou na instalação de escritórios em pequenas obras. O mínimo disponível era um bloco usado como mesa, e as necessidades fisiológicas precisavam ser contidas.

No entanto, no que diz respeito ao profissionalismo, não enfrentei problemas. Durante essa experiência, fui muito bem acolhida, sem preconceitos. Aprendi bastante e percebi que as pessoas começaram a dar mais abertura para que as mulheres ocupassem cargos semelhantes aos dos homens."

 

Você já foi a única mulher em alguma equipe de estágio ou trabalho prático? Se sim, Como lidou com isso?

Yara Raviua: "Já sim, inúmeras vezes. Ser única mulher na equipe exige autoconfiança nas próprias habilidades, de modo a superar barreiras de preconceito de gênero. Quando iniciei o estágio e foi me atribuída uma missão em ser responsável por uma infraestrutura, percebi que sem autoconfiança a pessoa, especialmente mulher nunca será respeitada, desde então comecei a lidar com essa diferença transformando-a em força e abracei a oportunidade para me destacar e tornando-me uma referência dentro da equipe."

Eng.ª Cleide Santos: "Sim, já passei por essa situação e lidei muito bem, pois houve abertura por parte dos meus colegas. Focávamos no profissionalismo, sem nos preocupar com questões de gênero, e priorizávamos discutir os assuntos relacionados à obra em vez de outras questões."

Nicolle Mapulango: "Não, como eu disse inicialmente trabalhei mais com mulheres, mas uma coisa que existiu bastante é o preconceito por parte dos homens quando se trata de uma engenheira, eles já têm em mente que por ser mulher não sabe nada, então ter que  provar constantemente que sei o que estou a fazer é cansativo."

 

Quais conselhos você daria para outras jovens mulheres que estão começando agora em engenharia civil, especialmente aquelas que enfrentam dificuldades semelhantes?

Yara Raviua: "Os conselhos que daria: acreditar na capacidade e competência que nós como gênero possuímos, pois temos o mesmo potencial e habilidades que qualquer outro engenheiro."

Eng.ª Cleide Santos: 

"Talvez eu não seja a melhor pessoa para falar sobre dificuldades, mas sim sobre os desafios que enfrentei e continuo enfrentando no início da carreira. Muitas de nós desistem cedo porque não é fácil ser mulher na área de Engenharia Civil em Moçambique. Muitas portas se fecham, pois ainda há a preferência por homens, sob a justificativa de que seriam mais resistentes a ambientes extremos de trabalho.

Meu conselho é: não desista tão cedo. Estamos em um momento em que alguns mercados estão mais abertos para receber mulheres, e precisamos de profissionais competentes para nos representar e quebrar essas barreiras."

Nicolle Mapulango: "Que não desistam dos seus sonhos, que se dediquem e mostrem que são boas  no que fazem e não deixem que ninguém as desmereça por serem mulheres."

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