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Inclinação Adequada em Sistemas de Drenagem de Águas Residuais
Inclinação Adequada em Sistemas de Drenagem de Águas Residuais
A inclinação das tubagens em sistemas de drenagem de águas residuais é um parâmetro crítico que influencia directamente a eficiência do transporte de efluentes, prevenindo obstruções, deposição de sólidos e mau funcionamento da rede. Este estudo aborda as normas técnicas europeias, recomendações de dimensionamento e critérios de projecto, com base em referências bibliográficas e estudos consolidados.
2. Normas Técnicas Europeias Relevantes
2.1. EN 12056: Sistemas de Drenagem por Gravidade no Interior de Edifícios
A norma EN 12056 estabelece os princípios para o dimensionamento de sistemas de drenagem por gravidade, incluindo inclinações mínimas e máximas para diferentes diâmetros de tubagem.
- Tubos horizontais (ramais e coletores):
- Diâmetro DN 50 a DN 100: Inclinação mínima de 2% (20 mm/m).
- Diâmetro DN 125 a DN 150: Inclinação mínima de 1% (10 mm/m).
- Diâmetro ≥ DN 200: Inclinação mínima de 0,5% (5 mm/m).
Fonte: EN 12056-2:2000 - Gravity drainage systems inside buildings - Part 2: Sanitary pipework, layout and calculation
2.2. EN 752: Sistemas de Drenagem no Exterior de Edifícios
A norma EN 752 regula o dimensionamento de redes de drenagem no exterior, incluindo critérios de inclinação para evitar sedimentação e garantir autolimpeza.
- Inclinação mínima recomendada:
- DN 150 a DN 300: 0,5% a 1% (5 a 10 mm/m).
- DN > 300: Pode ser reduzida para 0,3% (3 mm/m) se justificado por cálculos hidráulicos.
Fonte: EN 752:2017 - Drain and sewer systems outside buildings
3. Fundamentos Técnicos da Inclinação em Sistemas de Drenagem
3.1. Velocidade de Autolimpeza
Para evitar deposição de sólidos, a velocidade do fluxo deve ser suficiente para transportar partículas. A norma EN 752 recomenda:
- Velocidade mínima: 0,7 m/s (em condições de caudal mínimo).
- Velocidade máxima: 2,5 m/s (para evitar erosão e ruído excessivo).
3.2. Equação de Manning-Strickler
A inclinação (S) pode ser calculada usando a fórmula de Manning:
Referência: Chow, V.T. (1959) - Open-Channel Hydraulics
Exemplo Prático:
Equação de Manning-Strickler (Formulação para Cálculo da Inclinação)
Reorganizando para calcular a inclinação (S):
- Determinar a inclinação necessária para um tubo de DN 150 (0.15 m de diâmetro interno) em PVC, garantindo uma velocidade mínima de autolimpeza de 0.7 m/s.
Dados de Entrada:
- Diâmetro interno (D): 0.15 m (tubo circular cheio)
- Velocidade desejada (v): 0.7 m/s
- Coeficiente de rugosidade (n): 0.009 (PVC)
- Raio hidráulico (R): Para tubo circular cheio, R = D/4 = 0,15/4 = 0,0375m
Aplicar a Equação de Manning Reorganizada
Converter para Percentagem
S(%) = 0.0031 × 100 ≈ 0.31%
Resultado e Análise:
- Inclinação calculada: 0.31% (≈ 3.1 mm/m).
- Comparação com normas:
- EN 12056 recomenda 1% (10 mm/m) para DN 150.
Justificativa do Ajuste:
- Margem de Segurança:
- O cálculo teórico assume fluxo contínuo e pleno, mas na prática, caudais variam.
- Exemplo: Se o caudal diminuir 50%, a velocidade cairia para ~0.35 m/s (< 0.7 m/s), aumentando risco de sedimentação.
- Fórmula Revisada com Fator de Segurança (k = 1.5)
- Mesmo com este factor, ainda temos o Smin abaixo de 1%. Com isso a Norma prevalece.
Tabela Resumo do Cálculo
Velocidade calculada com Smin = 1%:
(Dentro do limite máximo de 2.5 m/s).
Parâmetro |
Valor Teórico |
Valor Normativo (EN 12056) |
Inclinação (S) |
0.31% |
1% |
Velocidade resultante |
0.7 m/s |
~1.3 m/s |
Adequação a DN 150 |
Insuficiente |
Conforme |
Recomendações Finais
- Use 1% de inclinação, mesmo que o cálculo teórico permita menos.
- Se possível, teste com caudal real (ex.: simulação em software como o EPANET).
- Em troços curtos (< 1 m), aceitam-se inclinações até 0.5% se justificado por projecto.
Fonte Normativa:
- EN 12056-2:2000 (§4.2.2): "Inclinações inferiores a 1% só são permitidas se comprovada a autolimpeza."
Obs.:
-
Por que é que o valor calculado é inferior à norma? A equação de Manning-Strickler assume condições ideais (fluxo uniforme, tubo circular cheio, entre outros.). Na prática, é comum aumentar a inclinação para compensar:
- Variações de caudal (ex.: períodos de baixo fluxo).
- Presença de sólidos (areias, gorduras, entre outros.).
-
Fórmula simplificada para projectos rápidos:
Para tubos de águas residuais (PVC, n ≈ 0.009), com uma velocidade mínima admissível segundo a EN 752 (v = 0.7 m/s) e considerando o raio hidráulico para tubo circular cheio (R = D/4), teremos:
Onde:
Smin - Inclinação mínima;
D - Diâmetro interno.
4. Estudos Comparativos e Recomendações Práticas
4.1. Recomendações da EPA (Environmental Protection Agency, EUA)
Embora não seja uma norma europeia, o relatório EPA/600/2-88/001 reforça a importância de inclinações adequadas, sugerindo:
- Mínimo absoluto: 0,4% (4 mm/m) para tubos de grande diâmetro.
- Ideal: 1% a 2% para tubos residenciais.
Fonte: EPA (1988) - Design Manual: Sewerage and Wastewater Systems
Referências Bibliográficas:
EN 12056-2:2000 - Gravity drainage systems inside buildings.
EN 752:2017 - Drain and sewer systems outside buildings.
Chow, V.T. (1959) - Open-Channel Hydraulics.
EPA (1988) - Design Manual: Sewerage and Wastewater Systems.
Autor: Eng.º Francisco Quisele Jr.
Data de publicação: 30/03/25
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